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“A heresia era definida num campo ideolu00f3gico, nu00e3o implicava em crime de conduta”

16 jun/2010

Um dos autores que mais contribui para a historiografia brasileira, Ronaldo Vainfas, trouxe para o Encontro às Quintas de 10 de junho o tema “A Inquisição Ibérica e a construção do conceito de heresia”, com o qual ele trabalha desde os anos 80.

Vainfas iniciou sua palestra esclarecendo que os conceitos de heresia e inquisição são inseparáveis, apesar do primeiro anteceder o segundo, porém “heresia era definida num campo ideológico, não implicava em crime de conduta”, mas era perseguida pelos tribunais da Inquisição. A heresia era um crime de consciência, uma atitude, um pensamento desviante do dogma oficial da Igreja. A palavra heresia, de origem grega, significa “escolha”, portanto, explicou Vainfas, na visão da Igreja quem “escolhe” é o Concílio de Trento e o Papa, sendo assim “o herege caminha perigosamente”.

 

Foto de perfil de Ronaldo Vainfas, sentado, segurando o microfone.

Foto: Roberto Jesus

 
As primeiras vítimas da Inquisição foram as minorias religiosas (judeus e muçulmanos, entre outros), que questionavam a autoridade apostólica do Papa. Os intelectuais, a exemplo de Galileu Galilei, físico, matemático, astrônomo e filósofo italiano que destacou-se na chamada Revolução Científica, também foram alvos, assim como as feiticeiras por serem consideradas devotas do diabo. Além disso, para ser herege era preciso ser cristão, por isso as minorias eram forçadas a se converter ao Cristianismo, completou Vainfas. Na Itália, berço do Renascimento, houve confisco de livros, censura. Nos casos das inquisições portuguesa e espanhola (ibérica) foram adotadas preocupações moralistas, sendo crimes a bigamia e a sodomia.

Segundo Vainfas, muitos processos inquisitórios contavam com as delações públicas, que tinham um peso importante já que a população local era bem pequena, e a vida era muito devassável. Dessa forma, o que era rumor público tornava-se um indício poderoso de culpa, pois tinha grande possibilidade de realmente ter acontecido. E os processos eram enormes, refletindo mais a importância da Inquisição do que o crime em si. Os réus tinham como procuradores os próprios funcionários do Santo Ofício.

Outro ponto importante ressaltado por Vainfas, é que a Inquisição é a instituição da pureza, portanto detesta misturas, foi por isso que também chocou-se com os jesuítas, que objetivavam ultrapassar as fronteiras e disseminar o judaísmo.

O palestrante ainda considerou que a Inquisição, apesar de ligada à Monarquia, era um Estado dentro do Estado, e quando ela fica no controle do Estado acaba perdendo seu vigor. Os inquisidores eram homens de lei, não teólogos, concluiu Vainfas.

Sobre o autor

Pós-Doutor pela Universidade de Lisboa, Portugal, Ronaldo Vainfas é licenciado em História pela Universidade Federal Fluminense, mestre pela mesma Universidade em História do Brasil, e Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo. Professor Titular de História Moderna da UFF, é pesquisador do CNPq no campo de história ibero-americana e luso-brasileira entre os séculos XVI e XVIII, principalmente nos seguintes temas: inquisição, jesuítas, religiosidades, sexualidades, escravidão, colonização.

Vainfas é autor dos livros: Trópico dos Pecados; Dicionário do Brasil Colonial (1500 – 1808); Dicionário do Brasil Imperial; Os protagonistas anônimos da História; Casamento, Amor e Desejo no Ocidente Cristão; Brasil de Todos os Santos, entre outros