Movido pela missão de disseminar o conhecimento científico, o Ciência Móvel, unidade itinerante do Museu da Vida Fiocruz, alcançou 1 milhão de visitantes durante ação social promovida, em 26 de abril, na quadra da escola de samba Estação Primeira de Mangueira, na zona norte do Rio de Janeiro. A marca histórica coube à baluarte da agremiação, Márcia da Silva Machado, a Guezinha, 74 anos, filha de Dona Neuma, considerada a primeira-dama da Mangueira.
Desde a primeira apresentação, em 2006, na 3ª Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, o Ciência Móvel percorreu mais 100 mil quilômetros de estrada para compartilhar com crianças, adolescentes e adultos o maravilhoso mundo da ciência. Durante esse período, foram realizadas 221 viagens a 129 municípios brasileiros. O projeto integra as realizações da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz), centro de pesquisa e documentação dedicado à história, à memória, à preservação do patrimônio cultural e às atividades de educação, informação e divulgação científica.
“Celebramos com alegria essa marca, que é resultado do nosso compromisso em divulgar e promover diálogos sobre ciência e saúde em localidades com pouco ou nenhum acesso a centros culturais. Essa ação tem potencial transformador, pois aproxima o público da ciência e inspira jovens e crianças a, quiçá, trilhar carreiras nessa área”, destaca o diretor da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz), Marcos José de Araújo Pinheiro.
Chefe do Museu da Vida Fiocruz, Ana Carolina Gonzalez festeja a solidez e a longevidade da iniciativa. “Quando, há quase 20 anos, tomou-se a corajosa decisão de escrever uma proposta para criação do Ciência Móvel, não se imaginava quão longe nosso museu itinerante chegaria. Hoje, somos referência e temos muito orgulho por sermos reconhecidos enquanto museu engajado com o enfrentamento das desigualdades em nosso país”, avalia ela, que cita a interiorização como um ponto primordial do projeto, presente desde a origem. “A popularização da ciência implicada com as questões sociais precisa estar comprometida com os esforços de descentralização”.
Cidadania por meio da popularização da ciência
Idealizador e primeiro coordenador do Ciência Móvel, José Ribamar Ferreira revela que há outro motivo para comemorações. Este ano, a unidade móvel do Museu da Vida Fiocruz atinge a maioridade. “Ambas [as razões] me levam a pensar que valeu a pena lutar pela viabilidade do projeto, em face do expressivo público atingido e por sua longevidade. Imagino o quanto o Ciência Móvel foi importante para crianças, adolescentes e a população em geral tomarem contato com uma ciência de qualidade, da excelência da Fiocruz, e em que proporção essa cultura científica terá sido significativa para suas visões de mundo”.
Ferreira, que esteve à frente do Ciência Móvel durante sete anos, frisa que o Ciência Móvel é uma iniciativa que inclui as populações sem acesso a equipamentos culturais e à cultura científica. “Trata-se de levar cidadania a quem está afastado geográfica e socialmente dos grandes centros, onde a oferta cultural é muito mais presente, apesar de ainda desigualmente distribuída”, avalia ele, considerando que o projeto é um “sonho da universalidade da educação aplicada à popularização da ciência”.
Fundação Vitae, Cecierj e parceria público-privada: apoios fundamentais
A história da unidade itinerante do Museu da Vida Fiocruz nasce com o edital Ciência Móvel, lançado pela Academia Brasileira de Ciências (ABC). A ideia inicial, inspirada em experiências da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e do Questacon (Austrália), era levar ciência para além dos muros da Fiocruz por meio de uma carreta, que seria transformada em uma auditório multimídia, onde seriam apresentadas diferentes atividades, como exibição de filmes científicos e realização de palestras, detalha Ferreira.
Os recursos obtidos no edital, porém, foram suficientes apenas para a compra do baú da carreta. Seria necessário ainda garantir financiamento para a compra do “cavalo mecânico”, indispensável para tornar a iniciativa itinerante.
O apoio que faltava para botar o Ciência Móvel na rua partiu de uma sugestão da cientista social Conceição Bongiovanni, responsável pela área de educação da Fundação Vitae, que estava com um projeto similar apresentado pelo Centro de Educação à Distância do Estado do Rio de Janeiro (Cecierj). “Ela propôs que o cavalo mecânico servisse aos dois projetos”, conta Ferreira, acrescentando que a criação de uma cesta de recursos público e privados também foi fundamental para viabilizar o projeto.
Trabalho em equipe
Integrante da equipe pioneira do Ciência Móvel, o biólogo Miguel Oliveira recorda que os anos iniciais do projeto exigiram muito esforço da equipe: “Nas primeiras viagens, montávamos e desmontávamos tudo. Não havia ainda equipe técnica de apoio, como atualmente”, diz o educador e divulgador científico, que visitou uma das inspirações para o Ciência Móvel, o Programa Museu Itinerante (Promusit), idealizado e realizado pelo professor Jeter Bertoletti no Museu de Ciência e Tecnologia da PUCRS.
Aos 40 anos, 18 deles dedicados às atividades do Museu da Vida Fiocruz, o pedagogo Leandro de Sant’Anna Carreira atualmente trabalha na manutenção das exposições, agenda de viagem e itinerância, dando suporte logístico e fazendo a interface com outros setores e unidades que demandam auxílio do serviço técnico. Ele cita uma experiência que julga inesquecível em sua trajetória no projeto: “Em uma das viagens, eu e o ‘Gambeta’ (técnico de som Rafael Antônio Ávila Gambeta) percebemos que um visitante da exposição, aluno da rede pública municipal, era daltônico. Ele não conseguia identificar as cores em uma das atividades, mas logo percebemos o problema e informamos à professora para buscar auxílio”.
Segundo Carreira, o episódio exemplifica que “o trabalho do técnico que atua na divulgação e popularização da ciência vai muito além do ato de montar e desmontar [os equipamentos]”.