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Experiências e estratégias para comunicação de questões éticas na Índia

31 mar/2011

A palestra apresentada pela médica indiana Hemalatha Somsekhar, que inaugurou o ano letivo do curso de especialização em Divulgação da Ciência, Tecnologia e Saúde, no dia 28 de abril, delineou uma série de experiências e estratégias para comunicar questões éticas, políticas e sociais em saúde, utilizando filme, teatro e outras ideias inovadoras que buscam o envolvimento público com a ciência.

Uma mulher de óculos, um homem  e uma mulher usando traje tipico indi8ano. Eles estão sorrindo, debruçados sobre uma mesa, diante de microfones
Na mesa de abertura, Luisa Massarani, chefe do
Museu da Vida; Paulo Elian, vice-diretor de Pesquisa,
Educação e Divulgação Científica, e a palestrante
Hemalatha Somsekhar.
Foto: Vinicius Pequeno

Inúmeras atividades permeiam a trajetória da médica indiana, entre elas o trabalho em projetos financiados pelo Wellcome Trust , como o Theatrescience,  no Reino Unido, participando de eventos que incluem workshops, peças teatrais e leituras.  

Hemalatha Somsekhar iniciou sua apresentação traçando um panorama da Índia. “Uma civilização de cinco mil anos, a Índia possui e 21 línguas diferentes, 18 delas oficiais, 29 estados e cinco territórios. É o sétimo maior país do mundo e o segundo mais populoso, com 1.2 bilhões de habitantes. Tem cinco mil e seiscentos jornais diários, 15 mil semanais. Estes números podem ter aumentado, porque estão um pouco desatualizados. Somos a maior democracia do mundo e a quarta economia. A maior nação de língua inglesa e segundo maior pool de cientistas e engenheiros do mundo”, disse ela enaltecendo as cores do país.  

A médica fez um breve histórico sobre a comunicação científica na Índia, que nas três ultimas décadas se intensificou. Muitas organizações governamentais e também não-governamentais vêm trabalhando nesse campo. Segundo ela, quando houve a independência da Índia, em 1947, Nehru, o primeiro ministro, introduziu o conceito de trabalhar com uma atitude analítica. “Ele queria que todos tivessem uma mente analítica”, disse.

moça morena usando traje típico da India fala ao microfone com as mãos sobre uma mesa

Hemalatha Somsekhar. Foto: Vinicius Pequeno

Sobre as instituições governamentais de comunicação científica na Índia, a médica citou o Instituto Nacional de Comunicação, criado em 1952; o Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia, criado em 1982; o Conselho de Nacional de Museus de Ciências, entre outras. Segundo Hemalatha, nos últimos 50 anos, o governo tem intensificado os trabalhos nessa área. 

O Kerala Sastra Sahitya Parishad (KSSP) é a ONG mais conhecida pelas atividades que desenvolve. Ela pertence a Kerala, estado da Índia em que mora a médica e, segundo ela, o mais alfabetizado e o que possui a menor taxa de mortalidade infantil. 

Fundado em 1962, o KSSP tinha 40 membros, entre professores de ciência e autores interessados em desenvolver ações sociais. “Eles escreviam artigos científicos na língua local e queriam tornar a ciência mais popular. Mas viram que aquilo não era suficiente. Então começaram a criar um movimento de ciências do povo. A ciência era utilizada para inclusão social”, afirmou a médica.

Atualmente o KSSP tem 40 mil membros, que trabalham em 21 unidades. Utilizam vários meios para se comunicar, como a palavra impressa, cartazes, a palavra falada e teatro (combinação de teatro de rua e de palco). “São também editores de ciência. A cada ano produzem de 40 a 50 novos títulos, além de jornais científicos. Às vezes também organizam campanhas no país inteiro, como a de um vazamento de gás, em 1987, utilizando teatro, música e dança”, informou Heamalatha.

Em relação ao governo, Hemalatha destacou o Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia. Segundo ela, é o mais ativo na área de comunicação científica. Desenvolve pesquisas, possue programas de treinamento em bioética para professores e militantes, trabalha com jornalistas, administra cursos para gestão de desastres, treina comunicadores para divulgar ciência e lidar com os vários mitos existentes na Índia, entre outras atividades.
A médica falou sobre a utilização de filmes nos programas de treinamento. “Para passar nossas mensagens utilizamos filmes, como ‘I’m still here’, que aborda a questão do Alzheimer. Eles são acompanhados de questionário e debates”, disse. Também promovem workshops de teatro, abordando questões éticas.

grupo de moças indianas com roupas tipicas sentadas em cadeiras, rindo, assistem peça de teatro

Pacientes do Hospital de Medicina Torácica do Governo
assistem apresentação teatral
. Foto: Gideon Mendel

Hemalatha também atuou no Theatrescience, projeto de colaboração entre organizações da Grã Bretanha, da Índia, autores, cientistas, professores e alunos. Inicialmente este programa foi conduzido na Índia e levou ao público um evento de oito dias, com leitura de textos e apresentação de peças, seguidas de discussões. Conforme disse a médica, havia uma base científica em todas as apresentações, com autores e artistas envolvidos nos tópicos científicos. Uma dessas leituras, “Bad blood Blues”, de Paul Sirret, será apresentada a partir do dia 1º de abril, no Museu da Vida. A história se passa na África Ocidental e é baseada em um ensaio clinico para pessoas com aids. Essa experiência foi depois levada para Londres, causando grande impacto.

A médica mencionou ainda alguns projetos em comunicação científica financiados pelo Wellcome Trust. Um deles é um projeto musical. “Os participantes utilizam a música para melhorar a comunicação sobre a incerteza dos resultados de ensaios clínicos. Usam a produção colaborativa de música para facilitar o diálogo entre as comunidades e o pessoal clínico sobre os riscos e benefícios da pesquisa, realizada em Joanesburgo, África do Sul”, disse Hemalatha destacando que essas músicas são transmitidas pelas rádios comunitárias locais.

figura_desenhohiv

Rolo apresentando uma pintura que retrata a contaminação
da Aids, através da transfusão de sangue.
Foto: Noel Alumit

Também foi abordado na palestra um projeto desenvolvido na Índia: o chamado Patua-Plus Project. Compreende atividades desenvolvidas para diminuir os estigmas do HIV. Em Bengal, área rural localizada na região nordeste da Índia, existem atividades implementadas por artesãos. “São artesãos que, orientados por médicos, desenrolam as pinturas, cantando músicas sobre a história dos problemas do HIV. Às vezes são histórias reais, de como você pode ser contaminado etc. No final, a pessoa que trabalha para o sistema de saúde fala à comunidade e responde as perguntas”, disse.