As experiências científicas com a substância alucinógena mescalina, entre a Primeira (1914-1918) e a Segunda (1939-1945) Guerras Mundiais, foram a base da apresentação da pesquisadora Jelena Martinovic, da Université de Lausanne (Suiça) e da University College London (Inglaterra), na primeira edição do Encontro às Quintas de 2019. Promovido pelo Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz), o evento aconteceu em 11 de abril, no Centro de Documentação e História da Saúde (CDHS), em Manguinhos (RJ).
Em Looking beyond the psychedelic 60s: mescaline experiments in the early twentieth century, Jelena Martinovic apresentou o estudo de caso baseado nas pesquisas médico-científicas do neurobiólogo alemão Heinrich Klüver (1897-1967), que fez testes e auto-experiências com a mescalina, alucinógeno natural extraído do cacto peiote (Lophophora williamsi). “Envolvido com a Psicologia Gestalt na Alemanha, antes de emigrar para os Estados Unidos, Klüver foi um dos protagonistas das experiências com mescalina a partir dos anos 1920. Ele tinha o interesse de investigar e compreender os mecanismos de alucinação e personalidade”, afirmou a pesquisadora.
De acordo com Jelena Martinovic, a historiografia sobre a psicodelia e o uso de substâncias alucinógenas privilegiou os eventos relacionados à contracultura dos anos 1960, sobretudo a partir da trajetória e dos experimentos de Albert Hoffman, cientista suíço considerado o pai do LSD. Ao investigar os acontecimentos anteriores à Segunda Guerra Mundial, a pesquisadora conecta e relaciona a história da farmacologia e da antropologia, buscando os diferentes significados do uso terapêutico ou religioso da mescalina e investigando seu potencial em pesquisas médico-científicas.
“Na história da psicofarmacologia antes de 1950, houve um grande interesse nos efeitos visuais e nas alucinações causadas pelo uso da mescalina. Se olharmos a literatura sobre os estudos da mescalina, sobre suas propriedades químicas e alucinógenas desde o final do século 19, a ênfase é colocada nas experiências visuais. O trabalho de Klüver permitiu importantes especulações sobre as imagens induzidas quimicamente e as suas relações com sonhos, ilusões, delírios e visões”, explicou Jelena Martinovic.
A pesquisadora destacou a importância desses estudos pioneiros realizados por Heinrich Klüver para o desenvolvimento da pesquisa científica e farmacológica no século 20. Ao testar em si próprio os efeitos alucinógenos da mescalina, Heinrich Klüver avançou na compreensão de questões relacionadas a doenças mentais e de personalidade, tentando descrever os seus efeitos, a partir de sua base sensorial. Mesmo que muitas de suas hipóteses não tenham sido comprovadas, seus estudos foram fundamentais para a geração de cientistas que ganharia notoriedade nos psicodélicos anos 1960.