Escavações revelam fundações antigas. Foto: DPH/COC |
Uma enxurrada que atingiu o Rio em 1966 fez desmoronar parte de um barranco às margens da Avenida Brasil, uma das vias mais movimentadas da capital fluminense. O corte no terreno trouxe à superfície artefatos históricos e pré-históricos que revelaram que a área – onde hoje estão os prédios do Pavilhão Rockfeller, que abriga parte do processo de produção de vacinas da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) – fora habitada por índios Tupinambás em séculos anteriores.
A descoberta foi resultado da primeira pesquisa arqueológica realizada no campus de Manguinhos. Os achados na área ao longo das últimas décadas foram o tema de palestra proferida no dia 10 de julho pelas arquitetas Inês Andrade e Cristina Coelho, do Departamento de Patrimônio Histórico da Casa de Oswaldo Cruz, sobre o elevado potencial arqueológico na área. No encontro, elas discutiram a identificação de descobertas fortuitas e o planejamento de escavações arqueológicas durante obras civis.
Coordenada pela professora Maria Beltrão, do Museu Nacional, a pesquisa arqueológica conduzida nos anos 60 – que encontrou vidrarias laboratoriais, ossadas, louças, cerâmicas indígenas e ferramentas – foi a primeira de uma série que se estendeu pelas décadas seguintes até os dias atuais. A mais recente está em andamento no local em que está sendo construído o Centro de Documentação e História da Saúde (CDHS).
“O campus da Fiocruz é considerado uma área com alto potencial arqueológico, pois tem a possibilidade de possuir, em seu solo, vestígios de um passado – sejam estruturas ou pequenos
Porcelanas, moedas, vidraria e ferramentas foram encontrados nas escavações. Fotos: DPH/COC |
artefatos (…) Muitos desses achados chegam até nós por descobertas fortuitas, mas também por pesquisas arqueológicas”, afirmou Inês. Ela ressaltou que esses vestígios referem-se a diferentes ocupações que se sucederam nessa área. “O sitio da Fiocruz tem uma sucessão de temporalidades.”
Um dos trabalhos feitos recentemente, em 2011, foi uma pesquisa de potencial arqueológico fora da área de preservação do campus, local que vem passando por um intenso processo de ocupação. De acordo com Cristina, uma pesquisa arqueológica com escavações só é feita quando já se sabe previamente que naquela área há possibilidade de se encontrar elementos históricos ou pré-históricos, como é o caso do CDHS. Para se aferir esse potencial, é feita uma pesquisa prévia.
“Quando se faz pesquisa de potencial, não se escavam grandes áreas. É uma investigação por amostragem. Nesse caso, procurou-se pesquisar toda essa área externa (ao perímetro de preservação do campus), porque na área protegida já se sabia que havia potencial (arqueológico) pelo que mostram as fotos históricas”, afirmou Cristina, referindo-se a imagens que mostram prédios que antes ocupavam áreas próximas ao Pavilhão Mourisco e já foram destruídos. De acordo com a arquiteta, no caso da pesquisa de potencial, faz-se penas poços de sondagem – pequenos furos – em áreas que não danifiquem edificações.
Arquitetas destacam importância do trabalho de educação patrimonial vinculado a serviços de arqueologia: Foto: COC |
Durante a palestra, as arquitetas ressaltaram que a legislação atual obriga que, em caso de qualquer achado arqueológico, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) seja imediatamente notificado e as obras paralisadas. Os artefatos ou objetos encontrados devem ser guardados temporariamente pela instituição até que o Iphan dê uma destinação para as peças. Na mais recente pesquisa arqueológica realizada no campus, foram encontradas, além de ossadas de mamíferos e vidraria laboratorial, as fundações de um complexo de incineração de lixo do século 19.
De acordo com as arquitetas, uma das etapas dos serviços de arqueologia contratados – como no caso do CDHS – que merecem destaque se refere aos programas de educação patrimonial. Tratam-se de ações de divulgação voltadas para a comunidade. “É sempre importante que, além das atividades técnicas de recuperação, conservação e pesquisa, haja um trabalho que busque ampliar o conhecimento sobre os projetos em questão e sobre os próprios bens que estão sendo objeto de preservação ou de pesquisa”, disse Cristina.