O que há em comum entre a participação do governo mexicano nas conferências sanitárias internacionais desde final do século 19, a evolução das políticas argentinas sobre a saúde do trabalhador na primeira metade do século 20, e a disputa entre Alemanha e França no intercâmbio com cientistas brasileiros nos anos 1920 e 1930? Uma pista deixada na tarde do dia 28/06, nas palestras de Ana María Carrillo (Universidade Nacional Autônoma do México), Karina Inés Ramacciotti (Universidade de Buenos Aires) e Magali Romero Sá (Fiocruz) é a estreita relação entre a construção de conhecimentos e ideologias no campo da saúde e a proteção das relações nacionais e internacionais de mercado.
Na palestra “México e a internacionalização da saúde pública durante o porfirismo e a revolução (1892-1921)”, Ana María Carrillo descreve como foi a quarentena imposta pelo governador do estado do Texas, em 1878, a todas as embarcações que vinham da África e da América Latina, para ilustrar os desafios impostos pelo protecionismo estadunidense à soberania mexicana, por mais de 40 anos. Os EUA alegavam que aquelas regiões não cumpriam as leis sanitárias internacionais, mesmo quando não havia qualquer prova de risco de contaminação.
Magali Romero Sá, Ana María Carrillo, Karina Inés Ramacciotti e Marcos Cueto. Foto de Roberto Jesus Oscar. |
“Embora a influência dos EUA quanto à saúde pública tenha sido tão dominante no México, o país manteve muito mais independência nessa matéria que outros países latino-americanos”, compara Carrillo, para concluir que, desde o governo do general Porfirio Diaz, o México tentou proteger a saúde dos seus cidadãos e o comércio exterior.
A Argentina, por sua vez, empreendeu esforços para buscar experiências sobre as políticas de saúde do trabalhador, especialmente no Chile e no Peru. Esse foi o tema da palestra de Karina Inés Ramacciotti. Aqueles países destacavam-se entre os latino-americanos, por organizar conferências e apresentar soluções neste campo. Saíram na frente ao propor discussões sobre “acidente de trabalho”, ao definir quais seriam os acidentes indenizáveis, as formas de assistência médica que contariam com a cobertura do Estado e como seriam as indenizações.
Nos três países, a maior preocupação era com o aumento dos custos com os tratamentos de reabilitação, sob a responsabilidade do empregador. “Os gastos recairiam sobre as empresas e isso levaria ao aumento dos preços”, afirma Ramacciotti que adiantou que sua pesquisa em andamento deve comparar as realidades de outros países sul-americanos no século 20, como Uruguai e Brasil.
Brasil, Argentina e México aparecem, finalmente, na palestra de Magali Romero Sá, que discutiu as relações científicas entre o Brasil e Europa nas décadas de 1920 e 1930. Os três países integravam os principais alvos de uma campanha francesa conhecida como Groupement, logo após a 1a Guerra Mundial, para a retomada da proeminência ideológica, mas também econômica, política e técnica da França na América Latina. No campo das ciências biomédicas, a França enfrentou uma dura rivalidade com a produção e circulação de conhecimentos vindos da Alemanha, em particular no Brasil.
Romero Sá destacou que, “no jogo da diplomacia científica, os canais de troca eram aproveitados como oportunidades de inserção em circuitos internacionais”. Segundo a pesquisadora, nas relações franco-brasileiras, “os médicos brasileiros foram beneficiados pela oportunidade de divulgar suas pesquisas originais na França”. Os alemães, por sua vez, conseguiram restabelecer seu prestígio e obtiveram reconhecimento no campo médico-científico, até mesmo durante a ascensão do nacional-socialismo.
Cobertura da manhã de 28/06 | Palestras de Adam Warren, Mariola Espinosa e Steven Palmer
Cobertura da tarde de 29/06 | Palestras de Jorge Lossio, Raul Necochea e Iris Borowy
Hist. cienc. saude-Manguinhos v.9 supl.0 Rio de Janeiro 2002
Hist. cienc. saude-Manguinhos v.13 n.3 Rio de Janeiro jul./set. 2006
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