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Curso de História da Medicina traz professor da Universidade de Michigan à Fiocruz

12 set/2014

Joel Howell
No primeiro encontro, o professor Joel Howell apresentou questões gerais relativas à conceitu-
ação e à demarcação do campo da história da medicina. Foto: Roberto Jesus Oscar

O Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde da Casa de Oswaldo Cruz (COC) promoveu em agosto o curso de extensão História da Medicina, ministrado pelo professor Joel Howell, do Departamento de História da Universidade de Michigan (EUA). A atividade, realizada a partir de um acordo de cooperação entre a instituição norte-americana e a Fiocruz, reuniu 88 alunos, entre estudantes de graduação, pós-graduação e pesquisadores, de diversas áreas do conhecimento, como história, ciências sociais, ciências biomédicas e ciências biológicas, alguns dos quais vindos de outros Estados.

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“A participação de 13 alunos e pesquisadores de outras unidades da Fiocruz – Icict, Ensp, EPSJV, INI, IOC, Biomanguinhos – merece destaque, na medida em que atende a uma das diretrizes da instituição e do acordo de cooperação, que é promover a integração e o diálogo entre diversas áreas de pesquisa e ensino em ambas as instituições”, afirma a coordenadora do programa de pós-graduação, Simone Kropf. O curso também teve a participação dos professores Flavio Edler, Luiz Otávio Ferreira, Luiz Antonio Teixeira, Gilberto Hochman, além de Simone Kropf, integrantes do corpo docente do mestrado e do doutorado em História das Ciências e da Saúde da COC.

Confira abaixo o resumo das aulas, preparado pela coordenação do curso:

Aula 1 – “O que é história da medicina? Métodos e abordagens”

No primeiro encontro, o professor Joel Howell apresentou questões gerais relativas à conceituação e à demarcação do campo da história da medicina, tendo em vista suas problemáticas, abordagens e metodologias. Entre os diversos temas discutidos, destacam-se a questão das diferenças e perspectivas de diálogo entre a história da medicina praticada por médicos e aquela produzida por historiadores, a dimensão histórica e social dos conhecimentos e das práticas médicas, e a problematização da visão tradicional que associa a medicina às ideias de “grandes gênios” e “feitos” e de progresso. As ideias de transformação e o caráter contingencial e contextual das concepções e práticas médicas foram o eixo central da discussão, que contou com a participação dos alunos. Nesta aula, o professor Flavio Edler (COC) apresentou comentários e questões relacionadas aos tópicos abordados pelo professor Howell, em diálogo com temas e perspectivas específicas do campo da história da medicina no Brasil.

Aula 2 – “Concepções de saúde e doença”

Turma assistindo à aula do professor Joel Howell
Curso reuniu 88 alunos de diferentes áreas do conhecimento, entre os quais história, ciências
sociais, ciências biomédicas e ciências biológicas. Foto: Roberto Jesus Oscar.

A segunda aula teve como objetivo discutir a historicidade das concepções e práticas médicas. Para tanto, o professor Howell abordou o caso histórico do médico húngaro Ignaz Philipp Semmelweis (1818-1865), conhecido por muitos como o “pioneiro” da assepsia, que viria a ser amplamente aceita a partir dos trabalhos de Joseph Lister em fins do século 19. Em detalhado estudo sobre as causas da elevada mortalidade por febre puerperal no Hospital Geral de Vienna, Semmelweiss propôs não apenas uma nova concepção sobre a etiologia desta doença, mas sobretudo a prática de lavar as mãos como pré-requisito para evitar essa e outras infecções e doenças no ambiente hospitalar. Considerando o fato de as ideias de Semmelweiss não terem sido aceitas e incorporadas na prática médica na época, o professor Howell propôs uma reflexão sobre como a legitimação e a aceitação das ideias médicas está diretamente associadas ao contexto político e social particular no qual elas são produzidas. Nesta aula, a professora Simone Kropf apresentou comentários aos temas discutidos por Howell, enfatizando alguns elementos teóricos e metodológicos relacionados ao estudo histórico das doenças em seu processo de construção social.

Aula 3 – “Medicina e Tecnologia: ciência médica e prática clínica”A aula problematizou a visão de que as tecnologias médicas são responsáveis pela progressiva superioridade da medicina, sobretudo ao longo do século 20. Analisando a história dos raios-X e do eletrocardiograma, temas de seu livro “Technology in the Hospital” (Baltimore: Johns Hopkins University Press, 1995), Howell discutiu os contextos históricos de produção e disseminação de tais tecnologias, hoje consideradas ferramentas obrigatórias e inquestionáveis no diagnóstico e na prática clínica, mostrando como tal processo envolveu não apenas grupos, conhecimentos, práticas e disputas no campo médico, mas também outros atores e esferas da vida social. Nesta aula, o professor Luiz Antonio Teixeira (COC) apresentou sua pesquisa sobre a história do câncer de colo do útero no Brasil, em especial no que se refere às tecnologias de diagnóstico, estabelecendo um diálogo com as questões tratadas por Howell.

Aula 4 – “Medicina e instituições: hospitais e ensino médico”

Joel Howell e Gilberto Hochman
Professores da pós-graduação, Gilberto Hochman (foto), Flavio Edler, Luiz Otávio Ferreira, Luiz
Antonio Teixeira e Simone Kropf, participaram do curso. Foto: Simone Kropf

Howell apresentou os principais marcos históricos e as distintas concepções que fizeram do hospital o espaço privilegiado para o tratamento de doenças nos séculos 19 e 20.  A atuação de distintos grupos profissionais nesse processo (como filantropos, médicos e enfermeiras), os modelos arquitetônicos que nortearam a construção de hospitais em consonância com as teorias médicas vigentes em cada período, e os formatos de administração desses espaços em distintos momentos históricos foram temas tratados. Nessa aula, o professor Luiz Otávio Ferreira apresentou um panorama dos estudos realizados sobre a história dos hospitais no Brasil.

Aula 5 – “Medicina e raça: o caso do “estudo da sífilis não-tratada de Tuskegee”

Na última aula, Howell abordou a história desse estudo clínico conduzido pelo Serviço Público de Saúde dos Estados Unidos em Tuskegee, Alabama, entre 1932 e 1972, no qual centenas de afro-americanos foram usados, sem informação e sem consentimento prévio, em experimentos sobre a progressão natural da sífilis sem tratamento. O caso foi apresentado de modo a suscitar reflexões sobre a relação entre medicina e raça, a prática de experimentação em humanos e a ética na pesquisa médica/científica, o que levou a um intenso debate com os participantes do curso. Na aula, o professor Gilberto Hochman apresentou comentários e reflexões sobre tais questões, indicando como tais temas vêm sendo abordados – ou ainda merecem estudos mais aprofundados – por parte dos historiadores da ciência e da saúde no Brasil.